Hoje escrevo sobre Tom Yendel, na esperança de que sua história toque outras vidas além da minha. Nascido em março de 1962, o pequeno Tom foi uma vítima da talidomida – substância que, ingerida por grávidas, pode causar deformação no feto, como perda ou atrofia de membros. Contudo, a ausência dos braços não impediu que conseguisse as primeiras conquistas em Winchester, no Sul da Inglaterra, cidade que serviu de palco para um verdadeiro exemplo de protagonismo.
O mais novo dos cinco filhos da família, já aos três anos de idade utilizava a boca e os pés para dar um colorido à própria vida. Logo se acostumou às tintas e pincéis para esboçar o que em breve seriam suas primeiras obras, sem imaginar o quanto a arte pudesse impactar a sua realidade, bem como a de familiares e amigos.
Tom afirma que nunca sofreu discriminação e teve um crescimento normal, com ótima convivência com outras crianças. No entanto, mesmo frequentando importantes instituições de ensino de seu país, enfrentou certo desânimo no período escolar. Mas tudo mudaria ao ser transferido para a Treloar College, em Alton, a melhor instituição de ensino (escola e faculdade) para pessoas com deficiências do país. Em Treolar teve um planejamento pedagógico adequado, que não apenas lhe devolveu a motivação para os estudos, mas também despertou o desejo de trabalhar como um grande defensor da educação especial.
Na reta final do ensino básico, Tom conseguiu vaga para fazer um curso de Expressive Arts na Brighton University, onde ainda se graduou em Arte Visual e História da Arte. Nessa fase, com o auxílio de técnicos, começou a fotografar, o que se tornou mais que um hobby. Também comprou sua primeira casa e se estabeleceu para uma vida de total independência. Acrescido ao anseio por liberdade, passou no teste de direção, usufruindo da sonhada mobilidade que o levou aos planejamentos para viajar por toda a Europa.
Pode-se dizer que de todas as realizações na Brighton a maior foi ter conhecido Lucy, que na época fazia o curso básico de arte na mesma instituição. Ela e Tom se casaram em 1988 e tiveram dois filhos, que foram cercados de todo carinho e dedicação que o pai certamente também tivera dos seus. E não é por acaso que este versátil artista se considere um homem com sorte, sempre falando orgulhosamente de sua esposa e dos filhos, Joseph e Holly, ambos bem sucedidos no mundo corporativo e empresarial.
A história de Tom com a APBP (Associação dos Pintores com a Boca e os Pés) iniciou em 1986, quando ingressou como bolsista. Desde então teve maior tranquilidade para conduzir uma vida mais focada nas pinturas. Como resultado do seu empenho nas exposições e projetos artísticos, conseguiu a promoção para Membro Associado em 1993 e, três anos depois, para Membro Pleno. Em 2013, em Viena, foi promovido a Membro do Conselho, tendo desde então uma responsabilidade de âmbito mundial.
Com a APBP Tom viajou para Sydney, Madrid, Lisboa, Finlândia, Dinamarca, Espanha e Brasil. Aqui, no Rio, tive a honra de recebê-lo. Por vazes acompanhado de Lucy, supervisiona a montagem de exposições nesses locais onde a diretoria da APBP promove assembleias com os artistas locais e de outros países. Por certo, um de seus grandes desafios e de todos os que compõem o Conselho consista em gerar, a despeito de pandemias e outros revezes, a indispensável visibilidade das atividades que desenvolve. Afinal, como é na rotina de Tom, a arte continua dignamente sendo produzida pelos artistas em todo o mundo, sempre visando reproduções em cartões e calendários vendidos nos 70 países em que a APBP se faz presente.
Quanto ao seu engajamento social iniciado na juventude, Tom viaja anualmente para Gana, na África, onde administra uma instituição de caridade e faz trabalhos voluntários, sendo uma das maneiras de retribuir o que recebera ao longo de uma vida abençoada. Isso tudo justifica o fato das diversas homenagens prestadas desde os mais simples ao mais graduados – um justo reconhecimento ao homem que escolheu, mais do que entender o significado da vida, registrar e compartilhar em atitudes uma história de sucesso através da arte.
O texto é de Marcelo Cunha, artista plástico filiado à APBP desde 2004